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30 de jan. de 2011

Concorrência chinesa se enfrenta com marcas, diz Alpargatas


Nem sobretaxa a importados, nem produção de calçados mais baratos. Na avaliação do presidente da Alpargatas, Márcio Utsch, para enfrentar a concorrência chinesa a indústria brasileira deve investir cada vez mais em suas marcas e na modernização de suas linhas de produção. “É quase impossível você competir com os chineses por custo.

Temos que competir pela marca, pelo posicionamento do produto, para que o consumidor perceba o diferencial”, afirma. (O G1 publica, desde o dia 10 de janeiro, uma série de reportagens sobre as perspectivas para a economia brasileira em 2011 em diversos setores. Já foram tratados os temas tributos, setor hoteleiro, microfranquias, aviação civil, etanol e construção civil). A China responde atualmente por cerca de 65% do calçado produzido no mundo.

Hoje, os chineses produzem 10 vezes mais que os brasileiros: cerca de 11 bilhões de pares contra 850 milhões. O Brasil é o terceiro maior produtor de calçados e o sexto maior exportador. Em 2010, a China exportou cerca de 8 bilhões de pares. O Brasil fechou 2010 com 143 milhões de pares exportados, segundo a Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados), O presidente da Alpargatas, companhia que detém as marcas Havaianas, Topper, Rainha, Mizuno, Dupé, Sete Léguas, Timberland e lojas Meggashop, afirma que o custo de produção chega a ser cinco vezes menor na China. Segundo Utsch, produção em grande escala, encargos menores, jornada de trabalho maior e moeda desvalorizada são os fatores que permitem a China vender calçados a preços muito mais baixos. “No calçadão de Frankfurt, tem sandália chinesa a 1 euro. A nossa é vendida a 25 euros. Mas isso não nos preocupa porque temos marca.

Não vendemos chinelo, vendemos Havaianas”, afirma o executivo. Desde março de 2010, o Brasil mantém uma sobretaxa de US$ 13,85 por par de sapato importado da China. Os fornecedores chineses são acusados de praticar dumping (vender produtos a um preço inferior ao praticado no mercado internacional). A sobretaxa vigorará por cinco anos e é adicional à tarifa de importação, que chega a 35% para artigos esportivos. A Alpargatas, porém, se diz contrária à tarifa antidumping. “Isso é um absurdo, é uma trava totalmente desnecessária. Aqui não é Coreia do Norte, temos o direito de comprar as coisas pelo preço que elas valem e não por um preço fictício, sobretaxado”, afirma Utsch, que considera a medida uma proteção artificial e inflacionária.

A sobretaxa é uma bandeira da Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados), que luta agora para estender o direito antidumping contra produtos provenientes do Vietnã, Malásia, Hong Kong e Indonésia, bem como para a importação de partes de calçados da China para montagem no Brasil. Segundo a entidade, os chineses têm usado a prática de triangulação das importações para mandar calçados para cá sem pagar sobretaxa. “Não é protecionismo. Defendemos os interesses da indústria nacional frente a uma concorrência predatória”, afirma Heitor Klein, diretor executivo da entidade. Segundo ele, a medida também tem por objetivo evitar a transferência de produção para países onde o custo de produção é menor e pressionar as grandes marcas multinacionais que importam calçados chineses a trocar os produtos asiáticos por versões fabricadas em empresas instaladas aqui.

As multinacionais, sobretudo as fabricantes de tênis, argumentam que a ação é equivocada porque coloca em um mesmo patamar tanto calçados mais simples como produtos mais sofisticados, como os chamados tênis de alta performance, cuja produção é concentrada lá fora. “Se tivermos livre competição aqui, a gente vai abrir espaço para o nosso produto lá fora também. Estou sendo prejudicado e o governo está perdendo impostos”, diz Utsch. A Alpargatas não revela, porém, o número de calçados importados. Em vez da sobretaxa, o presidente da Alpargatas defende uma política industrial para o setor de calçados, com linhas de financiamento especiais para a modernização das instalações dos pequenos e médios fabricantes. Polêmica à parte, os números da Abicalçados mostram um recuo na importação de calçados em 2010 e um crescimento do consumo interno.

O consumo per capita de calçados no Brasil subiu 5,3% em 2010, para uma média de 3,9 pares por pessoa. A produção da indústria calçadista cresceu 5,5%, atingindo 858 milhões de pares. As importações registraram uma queda de 5,5% (29 milhões de pares) e as exportações um aumento de 12,9% (143 milhões de pares). Internacionalização da Alpargatas Líder no mercado de sandálias e maior empresa brasileira em faturamento de calçados e acessórios esportivos, a Alpargatas tem obtido boa entrada no mercado internacional. Segundo Utsch, 30% do total da receita da companhia em 2010 foi gerada por moedas diferentes do real: dólar, euro e peso argentino. “Em 2005, esse percentual era inferior a 3%”, afirma o executivo Para 2014, o plano é levar essa participação para índices próximos a 40%. As marcas da Alpargatas estão presentes em 70 países em mais de 200 mil pontos de venda.

A companhia tem operação própria nos EUA, Espanha, Inglaterra, Itália, França, Portugal, Argentina e Uruguai. São 190 lojas próprias, 106 franqueadas e cerca de 200 mil pontos de venda no mundo. A companhia tem 18 mil empregados, dos quais 5,4 mil no exterior. “Somos uma empresa de marcas e a nossa estratégia é cada vez mais internacionalizar a Alpargatas”, diz Utsch. Segundo ele, 13% de toda a receita da companhia é investida em marketing. A transformação das modestas sandálias Havaianas em artigo de moda no mundo mostra o quanto o investimento em marca pode gerar. Atualmente, as Havaianas representam 54% das receitas da Alpargatas, que obteve uma receita bruta de R$ 1,9 bilhão até o 3º trimestre de 2010. Os números de 2010 ainda não foram divulgados.

A meta da companhia é alcançar em 2014 uma receia bruta de R$ 5,5 bilhões. “Hoje são 70 modelos diferentes de Havaianas, fora as cores. “Se você quiser ter uma de cada cor e tamanho, você vai ter que comprar 6.100 havaianas”, diz Utsch. A estratégia da marca é oferecer modelos diferentes para cada tipo de ponto de venda. Em 2010, segundo a Alpargatas, dos 350 milhões de pares de sandálias vendidos no país, 220 milhões foram pares de Havaianas. Considerando que o total de calçados vendidos no Brasil no ano passado somou 744 milhões de pares, segundo os dados da Abicalçados, as Havaianas respondem por cerca de 30% do total de calçados comprados no Brasil. Tênis Havaianas A Alpargatas não quer mais que as Havaianas sejam sinônimo só de chinelo. A estratégia agora é expandir a linha de produtos com a marca, incluindo bolsas, toalhas e, principalmente, tênis. Lançado no último inverno na Europa e disponível até então somente em algumas das lojas no Brasil, a linha de calçados fechados, batizada de "Soul Collection", é a grande aposta das Havaianas para o ano. O produto surgiu de um viés sazonal, para enfrentar a queda nas vendas de chinelos no Hemisfério Norte durante o inverno. “É um achado. Agora a gente vai ficar presente o ano inteiro nas vitrines internacionais”, diz Utsch.

O produto é um híbrido. O calçado mantém na sola e na palmilha a mesma borracha dos chinelos. O desenho da tira da sandália também está presente no acabamento. Por enquanto, são quatro modelos em várias cores. Além dos modelos de cano baixo e alto, há uma sapatilha com cobertura de lona. “Não é um tênis, é um produto diferente. A gente preserva a alma da marca, é como se fosse uma sandália”, explica Utsch. Segundo o executivo, o produto ficará numa faixa intermediária de preço, com preço médio entre R$ 70 e R$ 80. A empresa diz que uma estratégia de distribuição já está sendo colocada em prática para multiplicar os pontos de venda do novo produto e pretende aumentar os investimentos em publicidade. A Alpargatas não revela, porém, o volume de vendas em 2010 nem a previsão para 2011. "A concorrência está louca pra saber", desconversa Utsch. A empresa revela apenas que o plano é fazer com que a linha de novos produtos Havaianas cheguem a 15% do volume de negócios da marca até 2014. G1