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29 de mar. de 2011

ACABOU A AGONIA: morre José Alencar


"Estou preparado para a morte"

Andre Dusek/AE

"Um dia desses me disseram que, ao morrer, iria encontrar meu pai, falecido há mais de cinquenta anos. Aquilo me emocionou profundamente.

No Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo, o ex-vice-presidente da República José Alencar morreu por volta das 14h40 desta terça-feira (29), segundo o médico Raul Cutait. Desde o início da manhã, Alencar estava sedado, dormindo e sem dor.

Na porta do hospital, com a voz embargada, Cutait disse a jornalistas que Alencar estava acompanhado da família. Mais cedo, ele havia confirmado que a pressão do ex-vice estava muito baixa e que o intestino sofreu uma perfuração.

- Ele voltou a ter uma perfuração [intestinal] e peritonite [um tipo de inflamação], e não tinha mais condições de fazer uma intervenção cirúrgica.

Segundo ele, qualquer intervenção médica estava descartada e todos os cuidados médicos eram para que ele não sofresse.

Questionado sobre os procedimentos médicos, Cutait afirmou que as medidas se resumiram a aplicação de analgésicos para que ele não sofresse.

Acompanhe entrevista de José de Alencar no Programa de Jô Soares em 2010.

Biografia - José de Alencar

O Vice-Presidente da República José Alencar Gomes da Silva nasceu em 17 de outubro de 1931, no lugarejo de Itamuri, município de Muriaé, na Zona da Mata mineira, filho de Antônio Gomes da Silva e Dolores Peres Gomes da Silva.

Aos 14 anos de idade, deixou a casa paterna para trabalhar de balconista numa loja de armarinhos da cidade de Muriaé. Ganhava 600 cruzeiros por mês. Pouco tempo depois, tendo recebido proposta mais vantajosa, transferiu-se para Caratinga, onde continuou a trabalhar de balconista.

Aos 18 anos, emancipado pelo pai, estabeleceu-se como comerciante, com a lojinha "A Queimadeira", cujo nome foi sugerido por um viajante português, o senhor Lopes, sob o curioso argumento de que "se fosse um bar, seria Bar Cristal; mas não é um bar, então é "A Queimadeira", porque vai vender barato..." Ali se vendia de tudo um pouco: tecidos, calçados, chapéus, guarda-chuvas, sombrinhas, armarinho, etc.

Depois de "A Queimadeira", o ex Vice-Presidente da República foi viajante comercial, atacadista de cereais, dono de fábrica de macarrão, atacadista de tecidos e industrial do ramo de confecções.Em 1967, em parceria com o empresário e Deputado Luiz de Paula Ferreira, da área de beneficiamento de algodão, fundou em Montes Claros a Companhia de Tecidos Norte de Minas – Coteminas, hoje um dos maiores grupos industriais têxteis do país.

A Coteminas tem hoje 11 unidades industriais em quatro estados brasileiros – Minas Gerais, Rio Grande do Norte, Paraíba e Santa Catarina – e uma na Argentina. As 12 fábricas produzem e distribuem fios, tecidos, malhas, camisetas, meias, toalhas de banho e de rosto, roupões e lençóis, vendidos no mercado interno, nos Estados Unidos, Europa e países do Mercosul.

Na condição de empresário, José Alencar Gomes da Silva dedicou-se também às entidades de classe empresarial, tendo sido Presidente da Associação Comercial de Ubá, Diretor da Associação Comercial de Minas, Presidente do Sistema Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais e Vice-Presidente da Confederação Nacional da Indústria.

Reafirmando a vocação de servir – fio condutor de sua vida de empresário e cidadão – colocou a sua experiência administrativa a serviço de Minas e do Brasil, candidatando-se ao Palácio da Liberdade, em 1994, inovando a campanha eleitoral com uma postura de elevado sentido ético e de pregação cívica.

Em 1998, colocou seu nome novamente como candidato ao Senado Federal, elegendo-se Senador por Minas Gerais com consagradora votação: quase três milhões de votos. Finalmente, em 2002, compôs a chapa do candidato Luiz Inácio Lula da Silva, elegendo-se Vice-Presidente da República para o período 2003/2006.

Polêmica

No ano passado, o ex-vice-presidente se viu em meio a uma polêmica quando a Justiça de Minas determinou que ele reconhecesse a professora aposentada Rosemary de Morais como sua filha. O processo corria na Justiça desde 2000.

Alencar, porém, recorreu e, em entrevista ao programa do Jô Soares, da TV Globo, disse que não iria “ceder a chantagens”.

- Não há uma pessoa que tenha dito que essa mulher foi vista comigo algum dia. Então, como não há nenhum indício, as pessoas pegam por aquilo, ou fazem o DNA ou não fazem. [...] Então eu não vou me submeter a uma coisa dessa de forma nenhuma. Do contrário, todo mundo vai chegar e dizer você tem que fazer isso, fazer aquilo, com uma chantagem qualquer. E eu não estou habituado a ceder a chantagens.

Batalha contra o câncer

O ex-vice-presidente travou uma longa batalha contra a doença. Nos últimos 13 anos, enfrentou uma série de operações e tratamentos médicos. Foram mais de 15 cirurgias. Em abril de 2010, desistiu da candidatura ao Senado para se dedicar ao tratamento do câncer.

Desde 1997, foram mais de dez cirurgias para retirada de tumores no rim, estômago e região do abdômen, próstata, além de uma cirurgia no coração, em 2005.

A maior delas, realizada em janeiro de 2009, durou quase 18 horas. Nove tumores foram retirados. Exames realizados alguns meses depois, no entanto, mostraram a recorrência da doença.

Também em 2009, iniciou em Houston, nos Estados Unidos, um tratamento experimental contra o câncer. Alencar obteve autorização para participar, como voluntário, dos testes com um novo medicamento no hospital MD Anderson, referência no tratamento contra a doença. O tratamento não surtiu o efeito esperado e o então vice-presidente voltou a fazer quimioterapia em São Paulo.

José Alencar era casado com Mariza Campos Gomes da Silva e deixa três filhos: Josué Christiano, Maria da Graça e Patrícia.

Tratamento no exterior

O tratamento experimental nos EUA em 2009 não foi a primeira tentativa de Alencar de obter a cura fora do país. Ele já havia viajado para os Estados Unidos em 2006 para se tratar com especialistas. No ano seguinte, no entanto, os exames mostraram que o câncer havia se espalhado para o peritônio, uma membrana que reveste as paredes do abdômen.

Iniciava-se, então, a série de cirurgias na região. Em 2008, foram três internações. Em janeiro e em julho, exames mostraram uma reincidência de tumores abdominais. Em agosto, Alencar começou tratamento com um novo medicamento, a Trabectedina.

Com a saúde fragilizada, o ex-vice-presidente também foi internado por outros problemas. Em novembro de 2008, durante uma visita a Resende (RJ), teve fortes dores abdominais. O diagnóstico foi enterite (inflamação intestinal). Segundo os médicos, não havia relação com o câncer. Vinte dias depois, ele foi internado novamente, com quadro de insuficiência renal. Recebeu alta dois dias depois.

Sempre bem-humorado nas sucessivas vezes em que deixou o hospital Sírio-Libanês, chegava a brincar com seu próprio quadro clínico. "Estou melhor do que das outras vezes", repetia.

Após a maior das cirurgias, em 2009, Alencar saiu do hospital dizendo que não temia a morte. “Não tenho medo da morte, porque não sei o que é a morte. A gente não sabe se a morte é melhor ou pior. Eu não quero viver nenhum dia que não possa ser objeto de orgulho", afirmou. “Peço a Deus que não me dê nenhum tempo de vida a mais, a não ser que eu possa me orgulhar dele.”

Problemas de saúde ‘paralelos’


O ano de 2010 começaria com uma boa notícia para o então vice-presidente. O tumor que tratava vinha apresentando redução, segundo o hospital.

Alguns meses mais tarde, no entanto, ele começou a ter problemas de saúde “paralelos” ao câncer.

No início de maio, numa das idas ao hospital para a quimioterapia, apresentou pressão alta. Exames apontaram isquemia cardíaca e uma “obstrução grave” numa das artérias. Alencar então passou por um cateterismo e uma angioplastia e recebeu um “stent”, um mecanismo que “alarga” a artéria. No total, ficou nove dias internado.

No final do mesmo mês, queixando-se de fadiga, foi internado novamente. Após exames, o hospital constatou que ele estava anêmico e tinha um “quadro congestivo pulmonar”, consequência da quimioterapia. O tratamento, no entanto, continuava a dar resultados positivos, com a redução dos tumores.

No final de agosto, contraiu uma infecção, que foi tratada com antibióticos. Ele seria internado novamente poucos dias depois, no início de setembro, com o diagnóstico de edema agudo de pulmão. Foram mais seis dias no hospital.

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