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5 de mai. de 2011

Como era bom o meu São João!


Sou meio saudosista e, por sê-lo, abomino esse tipo de festas que as cidades fazem agora, principalmente as juninas, sem palhoças, sem danças, somente um palco armado no meio da rua, uma banda se exibindo com seu forró de plástico e um monte de gente olhando, como se fosse um show. A onda pegou e não se vê mais, pelo interior, os famosos "sambas" de antigamente, com os pares dançando nos salões de barro batido e o sanfoneiro, desengonçado, dedilhando o instrumento, acompanhado pelo trinado do triângulo, o compasso do pandeiro e o ritimado da zabumba.
O cabra se enfeitava, botava brilhantina no cabelo, vestia sua melhor "volta ao mundo" e ia para o forró dançar até entupigaitar. Antes de entrar na dança, bebia uma garrafa inteira de vinho de jurubeba Indiano, limpava os beiços, acendia um Astória e depois entrava no salão, certo de que a dama não o cortaria nas suas pretensões dançantes, porque se o fizesse receberia o castigo de passar o resto da noite de castigo na cozinha, fazendo café.
E os pares rolavam pela pista de dança, no pinicado do baião, do xote, da marchinha sertaneja, do forró animado, o suor descendo pelo cangote, a bufa subindo pelo colarinho, as coxas batendo umas nas outras, o encostar sensual de barrigas pedindo chamego, de vez em quando o dono da festa mandando alguns pares mais afoites tomarem compostura, o mestre do salão cobrando a cota para pagar ao sanfoneiro, a pausa para esquentar as orelhas com uma lapada de Altiva ou "Capim Santo", os namoros que daí surgiam, as poucas brigas que os ciúmes provocavam, o fim do baile com a chegada dos primeiros raios de sol, a volta para a casa dos corpos suados, cansados e saudosos e o gostinho de quero mais clamando pela próxima dança na noite seguinte.
E as quadrilhas? Eram suaves como a brisa da noite. Não tinham a ostentação dessas de agora, cópias fiéis das escolas de samba do Rio de Janeiro, com montes de jovens abusadamente enfeitados pulando no salão como cabritos, apresentando coreografias que em nada lembram as noites de São João do meu sertão enluarado. Parajara Duarte comandava os pares bem postos no extenso salão da Rua Grande, falando um francês perfeito, e também um português que todos entendiam, "anarriês", "adiante uma", "olhe o túnel!", e todos obedecendo o seu comando, enquanto o sanfoneiro executava a marchinha "Olha pru céu, meu amor, veja como ele está lindo!"
As barracas armadas no meio da rua principal serviam cervejas estupidamente geladas, que os dançarinos, sedentos, bebiam de um gole só, comendo bolo de milho, canjica e pamonha como tira-gosto. Quando a noite esfriava, sentava-se ao redor das fogueiras para esquentar os corpos e comer milho assado. Alguns tornavam-se compadres, outros padrinhos, outros tantos afilhados, sem contar com a solteirona que botava o rosto na bacia na esperança de ver o amado tardio chegando para acabar seu caritó.
Lourdes Branca era quenga. Na fogueira virou minha comadre de São João e nunca mais quís intimidades comigo. Não queria pecar, deitando-se com um compadre. Até naquele tempo tinha-se mais vergonha e respeito pelo santo.

Do Blog do Tião Lucena