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22 de out. de 2011

As crianças de hoje são mais inteligentes do que as das gerações passadas?


Sem perceber, os pais exageram no didatismo, querendo
ensinar, desde muito cedo, a razão das coisa para um bebê
que quer fazer o óbvio.

Para garantir um bom futuro aos filhos, alguns pais exageram nas atividades e educações. Veja como isto afeta o cotidiano das crianças

Há anos o psiquiatra João Augusto Figueiró faz as mesmas perguntas para mães de bebês: seu filho é bonito? É inteligente? Você o acha precoce? Todas as respostas são sempre positivas - 100% das mães têm filhos bonitos, inteligentes e precoces. Mas será que essa última palavra é realmente a correta para definir o bebê? Precoce é algo ou alguém que amadurece mais cedo do que os padrões, que está à frente de seus pares. Assim, quando se fala em uma criança precoce, aposta-se que ela está além das demais, que tem maior capacidade de aprendizagem e desenvolvimento do que as outras. Embora a pesquisa de Figueiró não tenha base científica, imagine como o mundo seria se todas as crianças fossem precoces como pensam seus pais. Talvez estivéssemos cercados de minigênios, que, de tão inteligentes e avançados, estariam fazendo muito mais do que compor sua primeira sinfonia aos 7 anos (como aconteceu com Mozart, um gênio - de verdade - da música clássica). Mas é claro que a realidade não é essa.

Esses bebês, afirma o psiquiatra, não são precoces. São tão normais quanto uma criança que nasceu há 40 anos. O que mudou é o cenário. De um lado, há o excesso de informação circulante, aumentando o estímulo ao aprendizado, e do outro lado, a pressão social, que pede seres humanos cada vez mais antenados e preparados. Entre tudo isso e o bebê, estão as figuras do pai e da mãe, responsáveis por criar e cuidar desse ser humano, preparando-o para se dar bem. Nesse ponto, a porca entorta o rabo porque os pais vêm seus filhos com as lentes que escolhem, geralmente moldadas pelo futuro que planejam para os rebentos. Entre enxergar o bebê como um ser normal ou como um pequeno Einstein, o limite é tênue. Tão tênue que gera confusão no período mais importante do desenvolvimento humano: a primeira infância, que vai até os 6 anos.

Descobrir o mundo

Sem perceber, os pais exageram no didatismo, querendo ensinar, desde muito cedo, a razão das coisas para um bebê que quer fazer o óbvio: brincar, descobrir, interagir. Mas, na ânsia de atender à demanda social de preparar os fi lhos para serem competentes na idade adulta, muita gente não enxerga que um bebê de quase 2 anos não é superinteligente só porque tem desenvoltura com o mouse do computador. Ele apenas já sabe manusear um eletrodoméstico de uso comum da família. "A criança nasce dentro de um cenário doméstico e absorve infl uências dos pais. Quando se pensa no desenvolvimento infantil, é preciso levar em conta o caldo cultural e social que a cerca", afi rma a pedagoga Maria Letícia Nascimento.

Outro ponto é entender que a criança tem competência inata, herdada e genética, o que dá condição para ela se desenvolver. "A competência começa ainda na gestação, quando a mãe, bem-cuidada, gera um bebê saudável e continua esse processo com a criança após o nascimento", explica a terapeuta Irene Maluf. A competência, diz ela, é imensurável, enquanto o desempenho para desenvolver uma tarefa é mensurável, aprendido ao longo do tempo. "Até os 6 anos, os pais devem investir na competência natural, sem se preocupar se a criança terá ou não um bom desempenho", afirma. Então, nessa fase, a ideia é deixar o pimpolho descobrir o mundo, sem precisar se sair bem em tudo

"A primeira infância é um período lúdico, de descobertas. Não pode haver pressão para o sucesso nem cobrança", ai rma o neuropediatra Marcelo Masruha Rodrigues. Para o médico, os adultos deveriam se importar mais em criar filhos felizes, que brinquem bastante, do que investir em uma educação pesada antes dos 6 anos. Segundo ele, o conceito atual da criança que vai à escolinha e tem várias atividades extracurriculares não é tão positivo quanto se imagina - com exceção do aprendizado de línguas. "Quem aprende duas línguas antes dos 5, 6 anos vai ser fluente em ambas e não terá sotaque. Após essa idade, a fluência é a mesma, embora a criança tenha sotaque." Mas criar um filho bilíngue pode ter efeitos reversos, como retardo da fala, dificuldade em formar frases e troca de palavras. "Os pais devem consultar o pediatra se acharem que o filho não as está articulando bem", diz o médico.

Antes de tudo, diversão

Brincar é altamente educativo. Por meio dessa atividade, pais e mães podem ensinar e aprender muito. Mas não devem criar expectativas. "Quando deixam as coisas acontecerem no seu tempo, os pais contêm a ansiedade em relação ao que esperam que a criança aprenda", afirma a professora de pedagogia Fernanda Muller. Durante a brincadeira, os pais, então relaxados, têm oportunidade de observar o que desperta o interesse dos filhos. "Nesse momento, devem aproveitar a brecha para estimular mais essa ou aquela aptidão", diz Maria Angela Barbato Coelho. Aí cabe comprar instrumentos musicais se o menino demonstra "jeito pra coisa".

Então, antes de planejar criar um exímio violinista, brinque com seu fi lho para despertar sua curiosidade e suas qualidades. Aproveite para ensinar conceitos como certo e errado, o lugar das coisas e como ser organizado, sem precisar ser didático e chato. "Os pais devem deixar a criança encontrar seu modo de ser e mostrar valores e regras de maneira discreta", diz a psicóloga Lidia Weber, partidária da ideia de que os filhos devem liderar a brincadeiras.

Do mdemulher.abril.com.br