Como eles nos influenciam?
Nossos costumes na forma de relacionar-nos na atualidade não
são recentes, nem podem ser tidos como uma escolha consciente. As diferentes
formas de como nos relacionamos com os parceiros tem uma história. Conhecê-la
nos dá a oportunidade de perceber nossos posicionamentos e atitudes frente à
relação conjugal, e as de nossos parceiros. Assim então, sim é possível
escolher conscientemente a forma de como vamos nos relacionar.
No começo deste século XXI temos uma configuração múltipla e
diversa de relações conjugais, isto é, co-existem vários tipos de alianças
entre casais:
1. Casamento por
interesses financeiros.
2. Casamentos em
que pelo menos um dos cônjuges mantém relacionamentos sexuais prazerosos fora
do casamento.
3. Casamentos
entre famílias tradicionais.
4. Casamentos que
dura “até que a morte os separe”, com ou sem amor.
5. Casamentos que
dura enquanto dura o amor-paixão.
6. Relacionamentos
onde priva o prazer sexual individual sem nenhum compromisso.
7. Relacionamentos
baseados no afeto, amizade e companheirismo. Tem objetivos de construção em
comum. A procriação não é o objetivo principal. A satisfação sexual mútua dá
sustentação e manutenção à relação.
Todas essas configurações são fruto de nossa historia e não
desapareceram com o tempo, ainda continuam co-existindo com os modelos mais
modernos de relação.
O amor e o casamento tal como o conhecemos hoje surgiu com a
burguesia a partir do século XVIII, quando a sexualidade passou a ocupar um
lugar importante dentro da relação.
Da Antigüidade à Idade Média, o amor no casamento não
existia, no sentido de escolha do parceiro e da paixão amorosa. A sexualidade
não era vivida como lugar do prazer e sim como de reprodução. Não era um
contrato entre dois indivíduos, era um negocio de família para o bem delas. Os
filhos eram parte dessa aliança de famílias. Este tipo de aliança se originou
nas tribos primitivas como forma de garantir a sobrevivência. Dessa forma os
bens considerados escassos ficavam garantidos no sistema de trocas entre
famílias. (Casamento tipo 1. Interesses financeiros).
No pensamento dos estóicos, século III a.C., o único bem do
homem é a virtude e não o prazer. A paixão é tida como contrária da virtude,
pois leva ao vício. A razão conduz à virtude.A paixão, na filosofia estóica, é
sempre má, pois é um movimento irracional. A partir desta forma de pensamento
os homens se apresentavam às mulheres como maridos e não como amantes. Para eles
o homem deve amar sua mulher com discernimento e não com paixão. Eles
diferenciavam oamor-contido no casamento e o amor-paixão fora do casamento. A
moral estóica tinha a procriação como finalidade do casamento. (Casamento tipo
2).
No século IV, época Feudal, o casamento passou a ser uma
aliança política entre famílias com o fim de garantir descendência, a posse das
terras o poder. Após as invasões Bárbaras, Europa ficou desbastada e para os
senhores feudais as terras era tudo o que tinham. Ter descendentes para
herdá-la garantia a posse e continuidade das terras na família. (Casamento tipo
3. Entre famílias tradicionais).
Depois do século V a Igreja passa a interferir na celebração
das núpcias e coloca regras no casamento para tentar submeter os cavaleiros ao
seu domínio através da moral dos padres. Os padres, marcados pelo asceticismo,
a castidade e a continência sexual, instituem o casamento como único lugar
legítimo para uso da sexualidade com o único objetivo da procriação. Baseados
nas epistolas do apóstolo Paulo aos Corintos: “que cada homem tenha uma mulher
e cada mulher tenha um homem. Melhor seria que ficassem castos, mas se não
podem se conter, casem-se”.
Apropriando-se da moral estóica, amor-contido no
casamento, estabeleceram as regras básicas:
1. Imposição da
relação sexual como obrigatória, sem a qual o casamento fica anulado.
2. Condenação de
todo ardor na relação sexual.
3. Minuciosa
classificação dos atos permitidos ou proibidos. Isto é, proibição de sexo oral,
anal e outros jogos sexuais dos casais, sendo apenas permitida a relação
genital com fim de procriação.
Restringindo assim a sexualidade ao casamento e à procriação.
(Casamento tipo 4. Baseado nas regras da Igreja).
Nos séculos XI e XII surge o amor cortés, precursor do amor
romântico. A amada era uma mulher casada, de família rival ou de outra classe
social, isto é, proibida. Isto incitava umapaixão desenfreada alimentada pelas
dificuldades e cheia de idealizações.
A partir do século XVIII com a ascensão da burguesia, a
Revolução Francesa a “ética protestante e o espírito capitalista” surge uma
mudança radical de valores. Rompe com as proibições da Igreja e valoriza o amor
individual e a escolha do parceiro. Isto foi fruto da ascensão das camadas
sociais da burguesia onde não havia intervenção externa nas relações conjugais.
Estabelece-se o casamento por amor com predomínio do erotismo. Esse novo ideal
impõe aos esposos que se amem e tenham expectativas de felicidade no
matrimônio. Mas esse amor individual romântico, carregado de expectativas e
idealizações provenientes do amor cortés, tornou-se uma armadilha fadada à
desilusão e aos conflitos do casal gerados pelo não cumprimento das
expectativas. (Casamento tipo 5. Baseado na paixão).
Com a ascensão do capitalismo nos séculos XIX e XX para dar
impulso ao desenvolvimento econômico, a procriação deixa de ser sua principal
finalidade dentro do casamento. A metas econômicas e a relação do casal são seu
foco principal. A condição econômica pesa na hora de decidir casar. A
racionalidade pesa mais que o amor romântico e a paixão sexual. O casamento
envolve mais despeças, podendo ter que sacrificar a carreira profissional.
Nessas condições aparecem as relações entre parceiros sem compromissos a médio
e longo prazo, pessoas que focam sua vida no desenvolvimento econômico e
profissional. (Relacionamento tipo 6. Individualismo capitalista). Surge como
alternativa possível o casamento entre indivíduos estão economicamente
independentes, centrados no vínculo conjugal e não nos filhos ou família. O
casamento passa a ser um refúgio num mundo competitivo e individualista.
O tipo de relacionamento 7 é uma proposta que se adequa as necessidades
de homens e mulheres do século XXI. Mantendo a individualidade, a independência
financeira e a maturidade emocional dos parceiros, eles se unem na relação
conjugal para construir objetivos comuns: filhos, família, trabalho conjunto,
lazer e tudo o que eles queiram co-criar com o esforço conjunto. Mantendo a
igualdade de direitos e obrigações dentro da relação. A partir dos recursos que
cada um possui, juntam-se para concretizar objetivos em comum, sem perder de
vista os objetivos individuais. O relacionamento é centrado no compromisso,
confiança e intimidade. A relação é baseada no afeto, amizade e companheirismo.
O prazer sexual recíproco é um elemento fundamental na manutenção da relação. O
amor-paixão e suas idealizações não fazem parte da relação.
Este último modelo de relacionamento absorve os pontos
positivos das formas anteriores: melhora das condições de vida e alcance de
objetivos comuns pelo esforço conjunto (tipo 1); a razão acima da paixão
evitando desilusões e emoções descontroladas (tipo 2 e 4); como os dois
contribuem para a realização de objetivos com a mesmas quantidades e
qualidades, ambos devem ter a mesma condição sócio-econômica-cultural (tipo 3);
há comprometimento dos parceiros na relação e nos objetivos conjuntos (tipo 4);
os parceiros permanecem juntos enquanto haja satisfação mutua dentro da
relação, mas não é a desilusão que os separaria e sim a divergência na busca de
objetivos já não comuns, permanecendo amor e respeito mesmo separados (tipo 5);
realização do prazer sexual dentro de uma relação baseada na intimidade e
confiança, como mantenedor da relação (tipo 2 e 6).
Reconhecer os pontos
negativos de nossa forma de relacionar-nos associados aos tipos de
relacionamentos antigos é uma boa forma de começar a encontrar uma relação mais
satisfatória e harmoniosa. OBSERVE em sua relação quais assuntos provocam
brigas e desentendimentos. Tente PERCEBER a quais características dos tipos de
relações antigos estão associados. ENTENDA que estes modelos antigos apareceram
por uma necessidade da época e pela forma de pensar que eles desenvolveram para
solucionar os problemas próprios daqueles tempos. Hoje as necessidades são
outras, a forma de pensar mudou, amadureceu, se aprimorou. As emoções
descontroladas deram lugar à razão e à busca do bem comum, sem sacrifícios de
nenhuma das partes. REFORMULE e MUDE. Contribua com o desenvolvimento das
relações de casal melhorando a sua! Boa
sorte!
*Nota: Os dados históricos de relacionamentos de casais
foram extraídas do artigo “Amor, casamento e sexualidade: velhas e novas
configurações” (2002) de Maria de Fátima Araújo Dra. em psicologia pela USP; do
artigo “Pequena história de amor conjugal no Ocidente Moderno” (2007) Mary del
Priore Dra em Historia pela USP; e de Wikipedia.