22 de mai. de 2013

Tablets nas Escolas Estaduais: Uma infeliz coincidência


Joalle Barros
Semana passada estive com um amigo, professor de história da rede estadual de ensino, e no meio daquela conversa de “como estão as coisas” e “como vai a família”, ele me perguntou se poderia ajudá-lo a desbloquear seu tablet. Intrigado, retruquei imediatamente:

– Rapaz, tablet não é celular, não precisa de desbloqueio pra usar.
Vendo que, obviamente, eu não sabia do que se tratava, logo ele elucidou:
– Este precisa, recebi da escola em que trabalho, e me falaram que precisa desbloquear pra usar, porque tem um bloqueio do Mec. E eu nunca mexi num tablet, não sei nem pra onde vai.

Vendo aquela situação em que meu amigo se encontrava, ficou evidente que aquela ferramenta tecnológica cuja guarda lhe fora confiada, em suas mãos, nada mais era do que uma caixa preta. Logo, num lapso de memória, intuí que a distribuição desses tablets por parte do governo não passava de mais uma reedição, super atualizada, da “política do pão e circo”.

Quem estudou História Geral e, principalmente, os professores de História, sabem bem que a política do pão e circo (panem et circenses, no original em Latim) como ficou conhecida, era o modo com o qual os líderes romanos lidavam com a população em geral, para mantê-la fiel à ordem estabelecida e conquistar o seu apoio. Assim, nos tempos de crise, as autoridades acalmavam o povo com a construção de enormes arenas, nas quais se realizavam desde batalhas sangrentas de gladiadores até apresentações com palhaços, e, aliado a isso, distribuíam comida para todos. A vantagem de tal prática era que, ao mesmo tempo em que a população ficava contente e apaziguada, a popularidade do imperador entre os mais humildes ficava consolidada. E todos esqueciam, por um tempo, a situação degradante em que viviam.

Voltando aos tempos atuais, e me permitindo a ousadia da analogia, em meio a um grave período de seca, que vem assolando quase todo o Estado, associado à queda acentuada na popularidade do Governador, o aparecimento de recursos federais para a distribuição dos tablets nas escolas não poderia ter vindo em melhor hora. Dá logo o “pão tecnológico” para o povo, e joga a notícia na imprensa. Grande notícia! Estudantes e professores da rede pública estadual agora estão conectados com a era tecnológica, um grande avanço na aprendizagem desses alunos!

Uma infeliz coincidência.

É claro que quem recebeu o tablet do Governo ficou satisfeitíssimo, e é óbvio que se trata de uma ferramenta muito útil dentro de uma sala de aula. No entanto, de que valem os tão famosos tablets se os professores e alunos não receberam qualquer tipo de treinamento de como utilizá-lo? De que valem os caríssimos tablets se não foram desenvolvidos aplicativos didáticos, específicos para cada disciplina oferecida? De que valem equipamentos de última geração se a estrutura das escolas ainda é pré-histórica, com banheiros interditados, salas de aula sucateadas, ginásios de esportes abandonados? De que valem? Quando muitos professores continuam sem receber sequer o piso salarial!

Valem muito, para manter a população contente e apaziguada.

O pão já está sendo distribuído. Quando ao circo, esperemos as festas juninas, certamente não faltarão recursos do Governo para a contratação de grandes atrações para o povo festejar.

Ah, quanto ao meu amigo, professor de história. Ele me falou que finalmente conseguiu desbloquear seu tablet, e que o tem utilizado muito, acessando o Facebook, Twitter, Instagram....

Joalle Barros


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