1 de ago. de 2013

O Pré-Sal e a Nova Geografia Econômica

O Brasil construiu, com esforço e sacrifício, uma indústria dinâmica e integrada que ajudou o país a crescer e a se tornar uma das maiores economias do mundo. Entretanto, a indústria vem apresentando sinais de perda de dinamismo. Indicadores básicos, como evolução do produto e emprego, mostram que a indústria está crescendo mais lentamente do que os demais setores e perdendo participação na economia.
Enquanto a indústria brasileira perde terreno, o mundo está passando por uma profunda transformação rumo a uma nova geografia da produção e da inovação, na qual a indústria é um dos principais protagonistas. Depois de muito tempo de desinteresse, os Estados Unidos voltaram a dar atenção à atividade manufatureira. Embora os custos do trabalho em solo americano sejam muito mais elevados do que nos países emergentes, a combinação de sofisticadas tecnologias, como a robótica e a impressão 3D, disponibilidade de sistemas integrados de serviços, infraestruturas, logística, laboratórios de inovação e desenvolvimento de produtos e elevada produtividade individual e sistêmica têm compensado o diferencial de custos, estimulando o retorno de fábricas inteiras para os Estados Unidos. Os aumentos dos custos do trabalho na China e dos fretes internacionais têm colocado ainda mais lenha nessa fogueira, conhecida como reshoring.
Países asiáticos, como Vietnã, Bangladesh e Filipinas, e países da África subsaariana, como Etiópia e Quênia, estão investindo na manufatura de massa, encorajados não apenas pelo crescimento dos mercados domésticos e regionais, mas, também, pela busca das multinacionais por diversificação geográfica da produção e por aumento dos custos do trabalho na China. Esta, por sua vez, está investindo cada vez mais naquelas regiões para produzir manufatura de massa e ampliar as suas cadeias globais de produção, ao mesmo tempo em que acelera a sua transição econômica por meio de um profundo upgrade tecnológico. De fato, são notáveis as suas conquistas em tecnologia espacial, defesa, supercomputadores, nanotecnologia, indústria mecânica e medicina, o que já têm lhes permitido competir com países avançados em vários segmentos industriais de alto valor agregado. A Coreia do Sul já ocupa lugar de destaque mundial em várias áreas importantes da indústria, como automóveis, embarcações e eletrônicos. A Tailândia, a Malásia e a Indonésia estão avançando feroz e decisivamente nas atividades industriais e já fazem parte de várias cadeias internacionais de produção. A Índia está trabalhando para duplicar a participação da sua indústria no PIB até meados da próxima década.
No campo da energia, grandes mudanças já apontam no horizonte. Os Estados Unidos estão se transformando numa grande potência em hidrocarbonetos por meio de novas tecnologias que estão viabilizando a exploração do gás e do óleo de xisto. A Agência Internacional de Energia já prevê que os Estados Unidos ultrapassarão a Arábia Saudita como maior produtor mundial de petróleo ainda antes de 2020 e estarão entre os maiores exportadores de petróleo, gás e derivados por volta de 2030.
A nova geografia econômica já está redesenhando a economia mundial e as consequências para o Brasil serão significativas. De imediato, apontam para o aumento da competição nos mercados. No médio prazo, haverá substanciais mudanças nas cadeias globais de produção, redes mundiais de inovação, comércio internacional, fluxos de capitais e na geração de emprego e renda. Por certo, esse complexo processo de transformação aumentará a pressão sobre a economia brasileira.
De fato, a entrada de países asiáticos na produção manufatureira internacional já acirra a competição nos mercados de bens menos elaborados e intensivos em trabalho. Se, por um lado, o upgrade tecnológico da China está abrindo espaço para economias, como a brasileira, produzirem manufaturas de menor valor agregado, por outro lado está aumentando a competição nos mercados de bens de mais alto valor agregado, incluindo aeronaves, bens de capitais, produtos químicos e de telecomunicações, setores em que o Brasil já ocupa espaço e em que almeja expandir a sua participação.
A revolução energética também terá impactos significativos no novo mapa da produção e do investimento. A queda do preço da energia nos Estados Unidos já está deslocando investimentos brasileiros intensivos em energia para aquele país sob a alegação de que o custo do gás no Brasil é ao menos quatro vezes maior.
No campo da inovação, ainda que com atraso, as atividades de pesquisa e desenvolvimento (P&D) do setor privado ensaiam seguir o caminho da globalização da produção. Os investimentos das empresas multinacionais (EMNs) em P&D em países emergentes aumentaram significativamente desde a década de 1990 e aceleraram recentemente. Embora as atividades mais sofisticadas de P&D ainda se concentrem nos países de origem das EMNs – notadamente Estados Unidos, Europa e Japão – há evidências de que os países emergentes já participam de forma mais efetiva e determinante das atividades de P&D daquelas empresas, indo além das atividades de rotina de adaptação de processos, testes, integração e desenvolvimento de produtos. Os casos da China e Índia são representativos. Em 2001, o número de centros de P&D de EMNs na China era de cerca de 100, mas, em 2008, esse número já havia passado de 1.100. Na Índia, a história não foi muito diferente.
Ainda não se sabe se e como esse processo, que ainda está se desenvolvendo, afetará de forma substancial a geografia internacional da inovação e a economia dos países avançados e emergentes. No entanto, é razoável supor que esse movimento será irreversível, devido ao aumento da contribuição dos países emergentes no crescimento da economia mundial, ao crescente investimento desses países em ciência e tecnologia, à crescente internacionalização das suas empresas, ao retorno de pessoas altamente qualificadas a seus países de origem, além da incipiente, mas crescente imigração de estrangeiros bem treinados para os países emergentes.
Como o Brasil figura na nova geografia econômica? Temos oportunidades de investimentos em inovação, tecnologia e adensamento de cadeias produtivas e aumento da produtividade e da competitividade para que o Brasil possa competir e participar de cadeias globais de produção e geração de valor? O objetivo deste artigo é oferecer insumos para se responder a essas perguntas. Em particular, explora-se o caso do pré-sal, setor que tem todas as características e potencial para ser um projeto transformador nos campos tecnológico e industrial e ser a porta de entrada do Brasil na nova geografia da produção e da inovação.
Para continuar a ler, clique aqui.
Fonte: Revista Interesse Nacional