A visão dos agricultores sobre o trabalho
da Emater no município de Picuí-PB (1)
AT: AGROECOLOGIA NA PROMOÇÃO DA QUALIDADE DE VIDA
Harisson
Henriques (2), Francisco Bezerra Junior (3), Heliomar
Santos (4), José Maricléferson Silva (5) e José Ranieri
Ferreira (6)
RESUMO
Desde o fim da Segunda Guerra Mundial,
instalaram-se, nos países subdesenvolvidos, políticas de Assistência Técnica e
Extensão Rural (Ater) que divulgavam e impunham pacotes tecnológicos, visando a
produção em massa, em grandes escalas e sem preocupação com os recursos
naturais.
Depois dos resultados negativos de tal
modelo de produção, a Agroecologia surge como um conceito científico, que busca
a revitalização dos recursos naturais, a preocupação com as relações sociais
envolvidas no processo agroprodutivo, integrados a sistemas econômicos.
Com a Agroecologia, vieram novos
pensamentos e, através de esforços do Ministério de Desenvolvimento Agrário
(MDA), foi criada, em 2007, a nova Política Nacional de Assistência Técnica e
Extensão Rural (Pnater), que busca um novo desenho das ações de Ater no Brasil.
A partir disto, o presente trabalho tem
o objetivo de identificar as metodologias através das quais vem sendo levadas
as atividades da Emater-PB no Município de Picuí-PB, para auxiliar tantos os
agricultores, quanto os próprios agentes de Ater da empresa a usufruírem da
nova Pnater, como instrumento de auxílio para o estímulo de práticas agrícolas
sustentáveis. Através da realização de visitas a campo e aplicação de
questionários e conversações, foram estudadas e pesquisadas as formas de
extensão rural desenvolvida pela empresa estatal no Município, observando o
não-cumprimento, em sua totalidade, dos princípios da Pnater. Há uma falha,
ainda, no sistema: tanto os agricultores não sabem muito sobre o trabalho da
Emater, quanto seus agentes ficam restritos, muitas vezes, a informações do
Pronaf, para compra de animais.
Termos de indexação: Ater, Agroecologia, Pnater.
INTRODUÇÃO
As imposições
dos pacotes tecnológicos da Assistência Técnica e Extensão Rural (Ater) do
período Pós-Guerra acarretaram fatores negativos, que ocasionaram na erosão e
desertificação do solo, bem como no prejuízo aos recursos naturais, com o uso
de insumos químicos, e, ainda, em um sistema capitalista de produção que arrebatou
e destruiu as relações sociais e campesinas de produção, criando um ambiente
hostil de disputa e “alienação” no meio rural.
A partir disto, a Agroecologia surge como um divisor
de águas e um marco rumo à sustentabilidade, adotando práticas que, segundo
Altieri, 2009, buscam compatibilizar, como resultado, um padrão de produção
agrícola que integre equilibradamente objetivos sociais, econômicos e
ambientais. Ainda segundo o autor, mesmo com vários desafios, esta agricultura
sustentável tem como principal objetivo a manutenção da produtividade agrícola
com o mínimo possível de impactos ambientais, além de retornos
econômico-financeiros adequados à meta de redução da pobreza, de modo a atender
às necessidades sociais das populações rurais. A Agroecologia é um enfoque
científico que apoia a transição dos modelos de agricultura e desenvolvimento
rural convencionais para estilos sustentáveis (CAPORAL e COSTABEBER, 2001,
2002). Defende a implantação dos princípios ecológicos no manejo e desenho de
agroecossistemas sustentáveis, numa associação do conhecimento local, do
agricultor, com o conhecimento técnico-científico, que serão base para a
construção da transição agroecológica (GLIESSMAN, 2000).
E aí entra a
figura bastante importante do Agente de Ater. Através da nova Política Nacional
da Ater (Pnater), as empresas que antes adotavam o difusionismo das práticas
convencioais, agora baseadas neste documento, têm a função de “levar” aos
agricultores, numa troca de experiências e conhecimentos, por meio de metodologias
participativas, ideais de práticas mais sustentáveis, que atentem aos
princípios agroecológicos. Esta nova Política tem como pilares o respeito à
pluralidade e às diversidades sociais, econômicas, étnicas, culturais e
ambientais do país, cabendo incluir enfoques de gênero, raça e etnia nos
programas e projetos, visando sempre a inclusão social da população rural
brasileira mais pobre (PNATER, 2007).
É bem verdade
que, em grande parte das empresas de Ater de todo o Brasil, um sistema
característico da Revolução Verde ainda é presente. Porém, surgem novas visões,
novos pensamentos voltados ao meio ambiente, novos anseios e necessidades dos
agricultores quanto às práticas agrícolas, o que faz com que seja necessária
toda uma reestruturação de tal sistema. E, ainda, novos profissionais saem das
Universidades com estes pensamentos e, muitas vezes, por causa da política da
empresa, não os colocam em prática. As ações atuais da Emater-RS/ASCAR
baseiam-se principalmente, de acordo com Siliprandi, 2002, em uma reformulação
no seu quadro funcional, abrangendo engenheiros agrônomos e florestais, médicos
veterinários, zootecnistas, sociólogos, antropólogos, economistas e pedagogos,
em uma ação interdisciplinar, indo de encontro aos trabalhos de Ater
desenvolvidos no humanismo assistencialista. São mantidos convênios com
Prefeituras Municipais, Secretarias de Estado, Órgãos Federais e Instituições
Financeiras. Junto com estas parcerias e a população, a Emater, através de
processos participativos, obtém resultados satisfatórios. Percebe-se uma
abordagem importante na questão de gênero nos sistemas produtivos.
A Emater-PB é a
principal empresa de Ater existente no Município de Picuí-PB e conta com
profissionais engajados no movimento agroecológico que também sentem a dificuldade
apontada anteriormente. Dificuldade esta que acaba atingindo os agricultores e
agricultoras, que sentem realmente falta de uma Ater mais presente nas
Comunidades do Município.
Após esta problematização, objetiva-se, com este
trabalho, criar um elo de ligação entre os profissionais de Ater da empresa e
os agricultores e agricultoras, levantando dados, necessidades e sugestões para
que o trabalho seja realizado da melhor maneira possível. Com isto, pretende-se
auxiliar ambos os lados no processo de construção do conhecimento agroecológico
como instrumento na busca pela sustentabilidade.
MATERIAL E MÉTODOS
O Município de
Picuí-PB fica localizado na Mesorregião da Borborema e Microrregião do Seridó
Oriental, com latitude -6.555º e longitude -36.340º. Com uma área de,
aproximadamente, 655.57 km2, possui densidade demográfica de 24.4
hab./km2 (2000), clima do tipo semi-árido, quente e seco, com
temperatura média de 26º, e, ainda, vegetação típica da Caatinga,
arbustivo-arbórea. Por fim, sua população é de 17.896 (IBGE, 2000) e tem um IDH
de 0,606 (PNUD, 2000).
Para a
realização deste trabalho, foram utilizados, em primeira instância, na visita
de campo, caneta esferográfica, papel ofício A4 e prancheta para anotações,
coleta de dados e preenchimento de questionário; máquina fotográfica digital
Samsung 7.2 megapixels para captura de imagens; MP4 Player Foston 4Gb para
gravação das entrevistas. E, em seguida,
notebook Dell Inspiron 15R para digitação do trabalho e transcrição das
entrevistas, no Microsoft Office Word 2007; elaboração de planilhas, tabelas e
gráficos para visualização dos dados e resultados, no Microsoft Office Excel
2007, e das imagens, no Visualizador de Fotos do Windows.
Sendo uma
pesquisa descritiva, coletaram-se dados, visando descrever as necessidades dos
agricultores, no aspecto da Ater. Métodos estatísticos foram levados em conta,
através dos quais foi retirada uma amostragem de 16 (dezesseis) comunidades
rurais, numa população das comunidades picuienses. Desta amostragem, foram
entrevistados agricultores, de acordo com sua disponibilidade, num total de 17
(dezessete), através de questionário com 10 perguntas fechadas e abertas,
debates e conversações.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Em suma, foram
encontradas respostas semelhantes, mostrando, assim, a percepção dos
agricultores abordados na pesquisa, quanto à prática de Assistência Técnica e
Extensão Rural no Município de Picuí-PB. Foi relatado pelos entrevistados que a
Ater existente na Comunidade é realizada pela Emater, por ONG’s e/ou entidades
sem fins lucrativos, ligadas à Articulação do Semi-Árido (ASA). Apesar de
relatarem a importância dos extensionistas no repasse de informações para as
melhorias das propriedades, observou-se a pouca freqüência dos serviços do
órgão estatal, fazendo com que os agricultores demonstrem a necessidade da
intensificação dos mesmos e o aumento no respeito aos conhecimentos locais.
Quanto à ajuda dos extensionistas, foram bastante citados os projetos ligados
ao Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar)
destinados à compra de animais, além da distribuição anual de sementes. Já,
quanto aos pontos negativos da assistência técnica da Emater, a burocracia foi
lembrada, assim como a tendência de acompanhar produtores com um nível avançado
de compreensão sobre novas práticas agrícolas, em detrimento do público de
agricultores familiares carentes de mais informações à melhoria da produção. De
modo geral, os agricultores não encontram dificuldade na procura da empresa,
mas identifica-se um distanciamento entre as partes, em virtude dos pontos
negativos acima citados.
Organizações
Não-Governamentais (ONG’s), sobretudo as ligadas à ASA, desempenham papel
importante na realização dos processos participativos de Ater nas comunidades
pesquisadas, atentando a oficinas de capacitação, diálogos horizontais com os
agricultores, voltados à valorização do conhecimento local e das práticas e
tecnologias sociais desenvolvidas pelo agricultor-experimentador. Já a Emater
ainda engatinha na reestruturação institucional e metodológica proposta pelo
MDA na nova Pnater, sob a lógica dos efeitos negativos dos pacotes tecnológicos
da Revolução Verde, baseados no difusionismo de técnicas de produção em grande
escala, com uma postura antidialógica de imposição de tal modelo, que
contribuiu com o agravamento da estrutura fundiária concentradora e excludente
do campo brasileiro. Observa-se uma certa resistência da empresa na nova lógica
de Assistência Técnica e Extensão Rural.
Existe uma
grande dificuldade das ONG’s no que diz respeito ao acesso a financiamentos
públicos, estabelecendo uma relação turbulenta com o Estado, através da
legislação que não contempla, plenamente, os anseios da sociedade civil
organizada. Por outro lado, as empresas estatais, inclusive a Emater-PB no
município abordado, limitam-se à distribuição anual de sementes e à elaboração
de projetos de financiamentos para compra de animais, que são ações louváveis e
amparadas pela nova Pnater, garantindo assim a preservação da biodiversidade – evitando a erosão genética –, bem como o acesso dos agricultores a políticas
públicas para o fortalecimento da Agricultura Familiar, embora não suficientes
para uma Ater de qualidade e que contemple os princípios e diretrizes da nova
Pnater.
A democratização
da informação no meio agrícola pelos meios de comunicação faz com o que os
agricultores adquiram um senso crítico a respeito das formas com que vem sendo
realizada a Ater e a organização em associações e cooperativas reforça as
práticas intercambiadas pelos próprios agricultores. A assistência técnica tem
o desafio de sistematizar experiências inovadoras, com base nos princípios
agroecológicos, através de processos participativos e uma educação humanística.
Seriam interessantes estudos realizados no campo destas pequenas ações
camponesas que resultam em grandes impactos positivos para um modelo de
agricultura familiar de base sustentável, para, daí, serem socializadas entre
os atores e atrizes da Ater e valorizadas no âmbito das políticas públicas.
CONCLUSÕES
1. Enquanto
profissionais, os agentes de Ater demonstram sensibilidade com uma nova lógica
de assistência técnica, porém a institucionalidade ainda voltada aos princípios
dos pacotes tecnológico da Revolução Verde oferece uma resistência aos novos
parâmetros de um modelo participativo e humanista de se fazer “extensão”.
2. Deve-se
colocar em pauta os objetivos e alcance das políticas públicas, a exemplo do
Pronaf, que não visa apenas a compra de animais – conforme percebido na
pesquisa –, mas o fortalecimento da agricultura familiar diversificada, com a
inclusão dos agricultores e agricultoras no processo de desenvolvimento rural
sustentável.
3. A Emater-PB
deve realizar parcerias com ONG’s, instituições de ensino e pesquisa e, até
mesmo, voluntários, a fim de fortalecer o corpo técnico e as metodologias
utilizadas nas atividades de Ater, de modo a atender, em sua plenitude, os
anseios dos agricultores e agricultoras.
AGRADECIMENTOS
Aos
agricultores, pelo compartilhamento de seus pensamentos, anseios e questões quanto
ao trabalho da Ater em suas comunidades.
LITERATURA CITADA
ALTIERI, Miguel. Agroecologia: a
dinâmica produtiva da agricultura sustentável. 5ª Ed. – Porto Alegre: Editora
da UFRGS, 2009, 117p.
BRASIL. Política Nacional de Assistência
Técnica e Extensão Rural. Brasília, 2007.
CAPORAL, F. R.; COSTABEBER, J. A.
Agroecologia: alguns conceitos e princípios. Brasilília, 2004, 24p.
FINATTO, R. A.; SALAMONI, G.; COSTA,
A.J.V. da; PANIS, M. Agroeocologia e Sustentabilidade: uma experiência de
extensão rural. In: XV Congresso de Iniciação Científica e VII Encontro de
Pós-Graduação. Pelotas, 2006. CD-ROM
FREIRE, Paulo. Extensão ou comunicação?
8ª Ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983, 65p.
LISITA, F.O. Considerações sobre a
extensão rural no Brasil. Disponível em: <http://www.agronline.com.br/artigos/artigo.php?id=219&pg=1&n=2> Acesso em
21 out 2010.
Picuí. In: Portal dos Municípios – FAMUP. Disponível em: < http://www.famup.com.br/portal/index.php?run=aspectos_fisicos>
Acesso em 16 nov 2010.
Siliprandi, E. C. Desafios para a
extensão rural: o “social” na transição agroecológica. In: Agroecologia e
Desenvolvimento Rural Sustentável, v.3. Porto Alegre, 2002, p. 38-48.
TAVARES, J. & RAMOS, L. Assistência
Técnica e Extensão Rural: construindo o conhecimento agroecológico. Manaus,
2006, 122p.
DA REDAÇÃO