6 de out. de 2011

PROFESSOR MARICLÉFERSON: Artigo sobre a visão dos agricultores sobre a EMATER



A visão dos agricultores sobre o trabalho da Emater no município de Picuí-PB (1)
AT: AGROECOLOGIA NA PROMOÇÃO DA QUALIDADE DE VIDA
Harisson Henriques (2), Francisco Bezerra Junior (3), Heliomar Santos (4), José Maricléferson Silva (5) e José Ranieri Ferreira (6)

RESUMO
Desde o fim da Segunda Guerra Mundial, instalaram-se, nos países subdesenvolvidos, políticas de Assistência Técnica e Extensão Rural (Ater) que divulgavam e impunham pacotes tecnológicos, visando a produção em massa, em grandes escalas e sem preocupação com os recursos naturais.
Depois dos resultados negativos de tal modelo de produção, a Agroecologia surge como um conceito científico, que busca a revitalização dos recursos naturais, a preocupação com as relações sociais envolvidas no processo agroprodutivo, integrados a sistemas econômicos.
Com a Agroecologia, vieram novos pensamentos e, através de esforços do Ministério de Desenvolvimento Agrário (MDA), foi criada, em 2007, a nova Política Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural (Pnater), que busca um novo desenho das ações de Ater no Brasil.
A partir disto, o presente trabalho tem o objetivo de identificar as metodologias através das quais vem sendo levadas as atividades da Emater-PB no Município de Picuí-PB, para auxiliar tantos os agricultores, quanto os próprios agentes de Ater da empresa a usufruírem da nova Pnater, como instrumento de auxílio para o estímulo de práticas agrícolas sustentáveis. Através da realização de visitas a campo e aplicação de questionários e conversações, foram estudadas e pesquisadas as formas de extensão rural desenvolvida pela empresa estatal no Município, observando o não-cumprimento, em sua totalidade, dos princípios da Pnater. Há uma falha, ainda, no sistema: tanto os agricultores não sabem muito sobre o trabalho da Emater, quanto seus agentes ficam restritos, muitas vezes, a informações do Pronaf, para compra de animais. 
Termos de indexação: Ater, Agroecologia, Pnater.

INTRODUÇÃO

As imposições dos pacotes tecnológicos da Assistência Técnica e Extensão Rural (Ater) do período Pós-Guerra acarretaram fatores negativos, que ocasionaram na erosão e desertificação do solo, bem como no prejuízo aos recursos naturais, com o uso de insumos químicos, e, ainda, em um sistema capitalista de produção que arrebatou e destruiu as relações sociais e campesinas de produção, criando um ambiente hostil de disputa e “alienação” no meio rural.
A partir disto, a Agroecologia surge como um divisor de águas e um marco rumo à sustentabilidade, adotando práticas que, segundo Altieri, 2009, buscam compatibilizar, como resultado, um padrão de produção agrícola que integre equilibradamente objetivos sociais, econômicos e ambientais. Ainda segundo o autor, mesmo com vários desafios, esta agricultura sustentável tem como principal objetivo a manutenção da produtividade agrícola com o mínimo possível de impactos ambientais, além de retornos econômico-financeiros adequados à meta de redução da pobreza, de modo a atender às necessidades sociais das populações rurais. A Agroecologia é um enfoque científico que apoia a transição dos modelos de agricultura e desenvolvimento rural convencionais para estilos sustentáveis (CAPORAL e COSTABEBER, 2001, 2002). Defende a implantação dos princípios ecológicos no manejo e desenho de agroecossistemas sustentáveis, numa associação do conhecimento local, do agricultor, com o conhecimento técnico-científico, que serão base para a construção da transição agroecológica (GLIESSMAN, 2000).

E aí entra a figura bastante importante do Agente de Ater. Através da nova Política Nacional da Ater (Pnater), as empresas que antes adotavam o difusionismo das práticas convencioais, agora baseadas neste documento, têm a função de “levar” aos agricultores, numa troca de experiências e conhecimentos, por meio de metodologias participativas, ideais de práticas mais sustentáveis, que atentem aos princípios agroecológicos. Esta nova Política tem como pilares o respeito à pluralidade e às diversidades sociais, econômicas, étnicas, culturais e ambientais do país, cabendo incluir enfoques de gênero, raça e etnia nos programas e projetos, visando sempre a inclusão social da população rural brasileira mais pobre (PNATER, 2007).
É bem verdade que, em grande parte das empresas de Ater de todo o Brasil, um sistema característico da Revolução Verde ainda é presente. Porém, surgem novas visões, novos pensamentos voltados ao meio ambiente, novos anseios e necessidades dos agricultores quanto às práticas agrícolas, o que faz com que seja necessária toda uma reestruturação de tal sistema. E, ainda, novos profissionais saem das Universidades com estes pensamentos e, muitas vezes, por causa da política da empresa, não os colocam em prática. As ações atuais da Emater-RS/ASCAR baseiam-se principalmente, de acordo com Siliprandi, 2002, em uma reformulação no seu quadro funcional, abrangendo engenheiros agrônomos e florestais, médicos veterinários, zootecnistas, sociólogos, antropólogos, economistas e pedagogos, em uma ação interdisciplinar, indo de encontro aos trabalhos de Ater desenvolvidos no humanismo assistencialista. São mantidos convênios com Prefeituras Municipais, Secretarias de Estado, Órgãos Federais e Instituições Financeiras. Junto com estas parcerias e a população, a Emater, através de processos participativos, obtém resultados satisfatórios. Percebe-se uma abordagem importante na questão de gênero nos sistemas produtivos.
A Emater-PB é a principal empresa de Ater existente no Município de Picuí-PB e conta com profissionais engajados no movimento agroecológico que também sentem a dificuldade apontada anteriormente. Dificuldade esta que acaba atingindo os agricultores e agricultoras, que sentem realmente falta de uma Ater mais presente nas Comunidades do Município.
Após esta problematização, objetiva-se, com este trabalho, criar um elo de ligação entre os profissionais de Ater da empresa e os agricultores e agricultoras, levantando dados, necessidades e sugestões para que o trabalho seja realizado da melhor maneira possível. Com isto, pretende-se auxiliar ambos os lados no processo de construção do conhecimento agroecológico como instrumento na busca pela sustentabilidade.


MATERIAL E MÉTODOS

O Município de Picuí-PB fica localizado na Mesorregião da Borborema e Microrregião do Seridó Oriental, com latitude -6.555º e longitude -36.340º. Com uma área de, aproximadamente, 655.57 km2, possui densidade demográfica de 24.4 hab./km2 (2000), clima do tipo semi-árido, quente e seco, com temperatura média de 26º, e, ainda, vegetação típica da Caatinga, arbustivo-arbórea. Por fim, sua população é de 17.896 (IBGE, 2000) e tem um IDH de 0,606 (PNUD, 2000).
Para a realização deste trabalho, foram utilizados, em primeira instância, na visita de campo, caneta esferográfica, papel ofício A4 e prancheta para anotações, coleta de dados e preenchimento de questionário; máquina fotográfica digital Samsung 7.2 megapixels para captura de imagens; MP4 Player Foston 4Gb para gravação das entrevistas. E, em seguida,  notebook Dell Inspiron 15R para digitação do trabalho e transcrição das entrevistas, no Microsoft Office Word 2007; elaboração de planilhas, tabelas e gráficos para visualização dos dados e resultados, no Microsoft Office Excel 2007, e das imagens, no Visualizador de Fotos do Windows.
Sendo uma pesquisa descritiva, coletaram-se dados, visando descrever as necessidades dos agricultores, no aspecto da Ater. Métodos estatísticos foram levados em conta, através dos quais foi retirada uma amostragem de 16 (dezesseis) comunidades rurais, numa população das comunidades picuienses. Desta amostragem, foram entrevistados agricultores, de acordo com sua disponibilidade, num total de 17 (dezessete), através de questionário com 10 perguntas fechadas e abertas, debates e conversações.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Em suma, foram encontradas respostas semelhantes, mostrando, assim, a percepção dos agricultores abordados na pesquisa, quanto à prática de Assistência Técnica e Extensão Rural no Município de Picuí-PB. Foi relatado pelos entrevistados que a Ater existente na Comunidade é realizada pela Emater, por ONG’s e/ou entidades sem fins lucrativos, ligadas à Articulação do Semi-Árido (ASA). Apesar de relatarem a importância dos extensionistas no repasse de informações para as melhorias das propriedades, observou-se a pouca freqüência dos serviços do órgão estatal, fazendo com que os agricultores demonstrem a necessidade da intensificação dos mesmos e o aumento no respeito aos conhecimentos locais. Quanto à ajuda dos extensionistas, foram bastante citados os projetos ligados ao Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar) destinados à compra de animais, além da distribuição anual de sementes. Já, quanto aos pontos negativos da assistência técnica da Emater, a burocracia foi lembrada, assim como a tendência de acompanhar produtores com um nível avançado de compreensão sobre novas práticas agrícolas, em detrimento do público de agricultores familiares carentes de mais informações à melhoria da produção. De modo geral, os agricultores não encontram dificuldade na procura da empresa, mas identifica-se um distanciamento entre as partes, em virtude dos pontos negativos acima citados.
Organizações Não-Governamentais (ONG’s), sobretudo as ligadas à ASA, desempenham papel importante na realização dos processos participativos de Ater nas comunidades pesquisadas, atentando a oficinas de capacitação, diálogos horizontais com os agricultores, voltados à valorização do conhecimento local e das práticas e tecnologias sociais desenvolvidas pelo agricultor-experimentador. Já a Emater ainda engatinha na reestruturação institucional e metodológica proposta pelo MDA na nova Pnater, sob a lógica dos efeitos negativos dos pacotes tecnológicos da Revolução Verde, baseados no difusionismo de técnicas de produção em grande escala, com uma postura antidialógica de imposição de tal modelo, que contribuiu com o agravamento da estrutura fundiária concentradora e excludente do campo brasileiro. Observa-se uma certa resistência da empresa na nova lógica de Assistência Técnica e Extensão Rural.
Existe uma grande dificuldade das ONG’s no que diz respeito ao acesso a financiamentos públicos, estabelecendo uma relação turbulenta com o Estado, através da legislação que não contempla, plenamente, os anseios da sociedade civil organizada. Por outro lado, as empresas estatais, inclusive a Emater-PB no município abordado, limitam-se à distribuição anual de sementes e à elaboração de projetos de financiamentos para compra de animais, que são ações louváveis e amparadas pela nova Pnater, garantindo assim a preservação da biodiversidade –   evitando a erosão genética –, bem  como o acesso dos agricultores a políticas públicas para o fortalecimento da Agricultura Familiar, embora não suficientes para uma Ater de qualidade e que contemple os princípios e diretrizes da nova Pnater.
A democratização da informação no meio agrícola pelos meios de comunicação faz com o que os agricultores adquiram um senso crítico a respeito das formas com que vem sendo realizada a Ater e a organização em associações e cooperativas reforça as práticas intercambiadas pelos próprios agricultores. A assistência técnica tem o desafio de sistematizar experiências inovadoras, com base nos princípios agroecológicos, através de processos participativos e uma educação humanística. Seriam interessantes estudos realizados no campo destas pequenas ações camponesas que resultam em grandes impactos positivos para um modelo de agricultura familiar de base sustentável, para, daí, serem socializadas entre os atores e atrizes da Ater e valorizadas no âmbito das políticas públicas.

CONCLUSÕES

1. Enquanto profissionais, os agentes de Ater demonstram sensibilidade com uma nova lógica de assistência técnica, porém a institucionalidade ainda voltada aos princípios dos pacotes tecnológico da Revolução Verde oferece uma resistência aos novos parâmetros de um modelo participativo e humanista de se fazer “extensão”.
2. Deve-se colocar em pauta os objetivos e alcance das políticas públicas, a exemplo do Pronaf, que não visa apenas a compra de animais – conforme percebido na pesquisa –, mas o fortalecimento da agricultura familiar diversificada, com a inclusão dos agricultores e agricultoras no processo de desenvolvimento rural sustentável.
3. A Emater-PB deve realizar parcerias com ONG’s, instituições de ensino e pesquisa e, até mesmo, voluntários, a fim de fortalecer o corpo técnico e as metodologias utilizadas nas atividades de Ater, de modo a atender, em sua plenitude, os anseios dos agricultores e agricultoras.

AGRADECIMENTOS

Aos agricultores, pelo compartilhamento de seus pensamentos, anseios e questões quanto ao trabalho da Ater em suas comunidades.

LITERATURA CITADA

ALTIERI, Miguel. Agroecologia: a dinâmica produtiva da agricultura sustentável. 5ª Ed. – Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2009, 117p.
BRASIL. Política Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural. Brasília, 2007.
CAPORAL, F. R.; COSTABEBER, J. A. Agroecologia: alguns conceitos e princípios. Brasilília, 2004, 24p.
FINATTO, R. A.; SALAMONI, G.; COSTA, A.J.V. da; PANIS, M. Agroeocologia e Sustentabilidade: uma experiência de extensão rural. In: XV Congresso de Iniciação Científica e VII Encontro de Pós-Graduação. Pelotas, 2006. CD-ROM
FREIRE, Paulo. Extensão ou comunicação? 8ª Ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983, 65p.
LISITA, F.O. Considerações sobre a extensão rural no Brasil. Disponível em: <http://www.agronline.com.br/artigos/artigo.php?id=219&pg=1&n=2> Acesso em 21 out 2010.
Picuí. In: Portal dos Municípios – FAMUP. Disponível em: < http://www.famup.com.br/portal/index.php?run=aspectos_fisicos> Acesso em 16 nov 2010.
Siliprandi, E. C. Desafios para a extensão rural: o “social” na transição agroecológica. In: Agroecologia e Desenvolvimento Rural Sustentável, v.3. Porto Alegre, 2002, p. 38-48.
TAVARES, J. & RAMOS, L. Assistência Técnica e Extensão Rural: construindo o conhecimento agroecológico. Manaus, 2006, 122p.

DA REDAÇÃO