Ao entrar no oitavo mês de Planalto e já contabilizar três demissões ministeriais de peso, os parlamentares da base aliada e ministros começam e emitir sinais de desconforto com o jeito Dilma Rousseff de governar. Eles temem o confronto com a presidente, não ousam fazer a crítica abertamente, mas têm a mesma queixa: 'Dilma amarra os parlamentares e anula os ministros'.
Por trás das decisões rápidas e ríspidas, principalmente depois de demissão de Antonio Palocci da Casa Civil, em junho, os aliados avaliam que 'o governo mostra desorientação e pode correr riscos desnecessários'. Os parlamentares dizem que a presidente está mais interessada em 'mandar do que governar' e falam em um tom que abre possibilidades para 'um troco'. Traduzindo: uma votação que, propositalmente, derrote o Planalto.
Mas são os ministros, que não têm as armas dos parlamentares, os mais incomodados. Depois de demitir também Alfredo Nascimento (Transportes) e Nelson Jobim (Defesa), Dilma reforçou o estilo centralizador e a paralisia aflige os ministros. Em conversas reservadas, os ministros ouvidos pelo Estado listam uma série de projetos prontos para serem apresentados à sociedade, mas que continuam na fila de espera, aguardando o aval da presidente. Isso pode ser bom para a imagem da petista, mas, dizem os ministros, fragiliza o governo.
Vazamentos. Detalhista, Dilma lê linha por linha de todos os projetos e manda refazê-los várias vezes. Os vazamentos de informações, principalmente de pedaços de propostas que ela não analisou, irritam a presidente, que não suporta disputas veladas entre auxiliares - ela está convencida de que muitos desses vazamentos têm por trás esse objetivo, sobretudo na equipe econômica. Beira o ódio presidencial a quebra da regra que não permite que ministros comentem temas de pastas alheias.
Dilma ficou furiosa, por exemplo, com o ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Fernando Pimentel, depois de ler nos jornais uma parte do projeto da política industrial, o Plano Brasil Maior, só divulgado no início da semana passada. Na solenidade de lançamento, no Planalto, a presidente anunciou o projeto como seu, e não do ministério, o que ofuscou a imagem de Pimentel.
Em quase todos os ministérios há projetos aguardando o desembargo presidencial. Na área do Ministério da Justiça, até agora não entraram em operação os Veículos Aéreos Não Tripulados (Vant), um dos xodós da candidata Dilma durante a campanha. Segundo o Ministério da Justiça, os Vant vão entrar em operação no fim do mês ou em setembro.
Também espera pela decisão da presidente o projeto que visa acabar com a superlotação carcerária no País. Mas o disciplinado ministro José Eduardo Cardozo cumpre a regra do silêncio e, cuidadoso, disse ao Estado: 'Estamos fechando (um pacote de medidas) com a presidente da República, então não posso divulgar detalhes. Mas em curto espaço de tempo vamos divulgar a primeira fase do programa de melhoria do sistema prisional'.
O Código de Mineração está pronto na pasta do ministro Edison Lobão, das Minas e Energia. A presidente decidiu ler as centenas de artigos do Código, um por um, o que impede que a proposta seja enviada ao Congresso.
Há outros exemplos de propostas nos escaninhos do Planalto e em fase de discussão com a presidente, como o projeto de regulamentação da venda de terras a estrangeiros, as propostas de inovação tecnológica, a Lei Geral da Copa e o prometido Sistema Nacional de Defesa Civil.
A reforma do sistema de pensões do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), a cargo do ministro Garibaldi Alves, não vai para diante enquanto não receber permissão presidencial. A assessoria de Dilma Rousseff afirmou que a presidente tem a preocupação em conhecer todos os detalhes das propostas feitas pelos ministérios, mas não é centralizadora. Além do mais, argumenta a Presidência, o governo não pode ser analisado pelos sete meses iniciais, mas pelo mandato.
A aparente tranquilidade palaciana com os julgamentos futuros não se reflete no dia a dia da presidente. A irritação de Dilma é visível. Na última sexta-feira, durante inauguração de 1,5 mil casas do projeto Minha Casa, Minha Vida, na Bahia, ela perdeu a paciência quando um repórter chamou os imóveis de 'casinhas'. No velho estilo do tempo em que era ministra - e que abandonou na campanha presidencial - Dilma reagiu com um 'meu querido', expressão que traduz sua máxima irritação.
Política. Ao contrário de apostas do início do governo, a presidente Dilma, apesar das queixas dos parlamentares e ministro, tem demonstrado mais desenvoltura política do que administrativa. Os dois escândalos que levaram à demissão de Palocci e de Nascimento não abalaram a sua popularidade. Mas atrasaram a execução de projetos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). No primeiro balanço do PAC, feito há uma semana, constatou-se uma redução de 10,8% no ritmo das obras em relação a ano passado.
Pesquisas qualitativas que circulam internamente no Planalto indicam que a população gostou da faxina que a presidente fez nos Transportes, resultando na demissão de 27 dirigentes. Logo após o escândalo que levou à queda de Palocci - que multiplicou seu patrimônio por 20 vezes só em 2010, quando coordenador da campanha de Dilma -, o Datafolha fez uma pesquisa para saber qual era a popularidade da presidente. Apurou 49% de aprovação, porcentual maior do que o de março (47%), e índice superior ao do ex-presidente Lula no mesmo período (43%). No Congresso, por enquanto, Dilma ganhou todas as votações no Senado. Na Câmara, só perdeu uma, a de uma emenda ao Código Florestal, Mas o segundo semestre começou bem mais tenso para a presidente.
Estadão