Prédio em Fortaleza é a 'casa dos papais noéis' na temporada
de Natal
Oito senhores passam o fim de ano trabalhando como papais
noéis no CE.
Cremes e 'dieta' fazem parte dos rituais para incorporar o
personagem.
A cada Natal, Fortaleza serve de morada temporária para um
animado grupo de papais noéis vindos de várias partes do país e até da Itália.
Este ano, os oito alugaram um andar inteiro em um prédio no Bairro Papicu, onde
preparam-se para, em média, 10 horas diárias de conversas, fotos e “ho ho hos”
em shoppings, escolas e residências. Na república dos bons velhinhos, a mamãe
noel é a empregada doméstica Maria Celsa, as bermudas substituem a roupa quente
de lã e a geladeira é cheia. “E ainda desconfiam que nossa barriga não é
natural”, brinca o italiano Benedetto Sanfilippo, 68 anos, o mais velho do
grupo.
"Ser papai noel todo dia é um ano a mais que eu ganho
na vida”, afirma o mineiro Maxwell Volali. “Você renasce só de conversar com a
criança”, diz Osvaldo Vagner. A turma é composta de aposentados que moram no
Rio de Janeiro, Paraná, São Paulo, Minas Gerais e na Itália onde foram
taxistas, metalúrgicos, atores ou microempresários. A rotina dos papais noéis
começa cedo. Na manhã em que o G1 visitou a casa, o primeiro a sair para o
trabalho despediu-se às 8h com destino a uma escola. Os outros haviam acabado
de tomar café e assistiam à TV enquanto aguardavam a hora de pegar no batente.
Segundo o empresário do grupo, Marcos Teles, a maratona de
trabalho dura cerca de 60 dias. “Geralmente, começamos em outubro e vamos até,
no máximo, dia 25 de dezembro”, afirma. Teles explica também que os oito papais
noéis passaram por uma seleção rigorosa para integrar a agência: “O que pesa
mais é o carinho deles com as crianças. Depois, analisamos a semelhança do
porte físico com a imagem do personagem clássico”.
O carioca Eubirajara Garcia, 67 anos, trabalha como Papai
Noel há dois anos, desde que foi descoberto na rua e uma pessoa pediu para
levá-lo à agência de Teles. “Antes disso, só havia me vestido de Papai Noel nos
anos 1970, quando ainda nem tinha barba”, conta. Desde então, Garcia decidiu
manter a principal característica do personagem e nunca mais cortou a barba,
diferente do colega Osvaldo Vagner, que muda de visual duas vezes ao ano para
garantir o emprego. “No dia 27 de dezembro, nem eu me reconheço. É o dia em que
corto a barba e só deixo crescer a partir de março”, explica.
O cuidado em manter a aparência do personagem inclui o uso
de cremes na barba e uma dieta “rica em gorduras”, segundo o empresário. A
barriga é natural, diz Sanfilippo, que raramente é visto longe da escova que
usa para alisar os cabelos dele, e quando quer fazer graça, até os dos colegas.
Os oito dizem que a empregada doméstica Maria Celsa é a Mamãe Noel. Ela trabalha
há seis anos preparando a alimentação e lavando as roupas do grupo. “São muito
brincalhões. É bom demais trabalhar com eles. Me divirto muito”, afirma.
Mas a vida de papai noel não é tão fácil quanto parece. A
maioria reclama do calor do figurino de lã quando fazem trabalhos em lugares
abertos. Sobre o incômodo, o mineiro Dirceu de Souza comenta: “O que não
fazemos para deixar as crianças felizes, hein?”. Outro problema é o flash das
máquinas fotográficas. “São umas 300 fotos por dia. No fim, não enxergamos mais
nada pela frente”, dizem.
Para alguns, a vocação de papai noel começou dentro de casa.
“Minha sobrinha sempre disse que eu era o 'titio noel' da família”, conta
Garcia. Já Osvaldo é acostumado com o personagem desde criança, quando a mãe
vestia a roupa vermelha e a barba postiça para entregar os presentes: “Levei essa tradição para os meus filhos e a
gente sempre brincou no Natal”.
Na convivência, os papais noéis trocam relatos dos pedidos
mais marcantes que recebem. “Entro no clima da criança e às vezes choro junto
quando o pedido envolve resolução de conflitos familiares ou de saúde”, diz o
mineiro Volali. Os aposentados não têm descanso nem na noite de Natal, quando
são contratados por famílias para animar ceias particulares.
G1PB