Segundo a Revista Veja, o Governo da Paraíba paga um dos piores salários do Brasil aos agentes de segurança pública
Reportagem "Dinheiro, sangue e caos" publicada na página 56 da edição 2.251 da Revista Veja (Crédito: Reprodução / WSCOM)
A edição 2.251 da Revista Veja já está nas bancas e traz uma reportagem especial sobre o aumento da insegurança em vários estados nordestinos. Com o título 'Dinheiro, sangue e caos', a publicação revela que a Paraíba paga um dos piores salários do Brasil aos seus policiais.
A Revista Veja denuncia ainda que o Governo da Paraíba adquiriu recentemente equipamentos de última geração para de análise pericial, “mas não consegue usá-los, já que não há policiais com treinamento adequado para operá-los.”
Leia abaixo a reportagem da Revista Veja na íntegra:
Dinheiro, sangue e caos
Por um dia, a quinta maior capital do país virou uma cidade fantasma. Na terça-feira passada, as mais movimentadas avenidas de Fortaleza ficaram desertas. Lojas de todos os bairros fecharam as portas. Turistas foram obrigados a abandonar as praias e se refugiar nos hotéis.
O medo tomou conta dos moradores - e não sem motivo. Cenas de um linchamento de um suspeito de roubo foram parar na internet e, na televisão e nas rádios, multiplicaram-se as notícias de assaltos e arrastões cometidos por bandidos que se aproveitaram da ausência de policiais nas ruas.
Do dia 29 de dezembro até a noite da última terça-feira, os policiais militares de Fortaleza ficaram aquartelados e deixaram a já conflagrada capital cearense à mercê dos criminosos. Ao darem curso a uma greve ilegal, aproximaram-se daqueles que deveriam combater. Adotaram o figurino e o comportamento dos marginais. Com o rosto coberto por capuz para não serem reconhecidos, e punidos, eles ameaçaram quem queria trabalhar, depredaram viaturas e ignoraram a ordem judicial de retornar às funções. Na sequência da greve da PM, os policiais civis da capital também cruzaram os braços. As delegacias ficaram paradas e até o Instituto Médico-Legal teve suas atividades comprometidas.
Em 2011, outros quatro estados nordestinos - Alagoas, Maranhão, Paraíba e Piauí - padeceram com greves de policiais. Em comum, todos eles compartilham o fato de ser mal pagos, mal treinados e mal equipados. A bandidagem tem tirado o máximo proveito da situação. Na última década, o número de homicídios dobrou na região.
Atualmente, um em cada três assassinatos cometidos no Brasil é registrado entre os nordestinos. Quando comparadas as taxas de homicídio, o Nordeste só perde para a Região Norte, onde em 2010 a taxa chegou a 37,4 assassinatos para cada 100000 habitantes. Das cinquenta cidades onde mais se mata, 37 ficam no Norte ou no Nordeste.
Trata-se de um fenômeno iniciado na última década cuja raiz, afirmam especialistas, está na migração da criminalidade. "Além dos bandidos locais, quadrilhas organizadas de outros estados migraram sobretudo para o Nordeste, atraídas pelo aumento do poder aquisitivo da região e para fugir do endurecimento das polícias, principalmente a de São Paulo", afirma Carlos Alberto da Costa Gomes, coordenador do Observatório de Segurança Pública da Universidade Salvador.
A fragilidade das forças policiais nordestinas é flagrante. No Ceará, onde o governo gastou 64 milhões de reais para comprar 428 viaturas modelo Toyota Hilux SW4 (cada uma custou ao Erário 150000 reais e resultará num custo de manutenção de 28000 reais anuais), o tempo de formação dos policiais do programa chamado Ronda do Quarteirão foi reduzido de seis para três meses.
Na Paraíba, o governo adquiriu equipamentos de análise pericial de última geração, mas não consegue usá-los, já que não há policiais com treinamento adequado para operá-los. "Grande parte dos administradores estaduais dessas regiões teve gestões desastrosas em relação à segurança", diz o coronel José Vicente, ex-secretário nacional de Segurança Pública. Para o especialista, isso produz reflexos não apenas entre criminosos. "Quando o cidadão percebe que a impunidade reina, os conflitos resolvidos a bala tendem a aumentar drasticamente".
Enquanto as políticas públicas fracassam, certas atividades privadas prosperam. O empresário Antonio Ricardo de Souza, por exemplo, dono de uma empresa de segurança, garante 70% de seu faturamento com fornecimento de cães de guarda para condomínios, lojas, empresas e até uma funerária de Fortaleza. Por um guarda acompanhado de um animal treinado, Souza cobra 4700 reais por mês. Seu negócio cresce a taxas anuais de 11%. "Os cães têm ganhado do mercado de seguranças armados por causa do medo que as pessoas têm de tiroteios", diz.
O Nordeste apresentou o maior aumento do produto interno bruto entre as regiões brasileiras na última década e exibiu os melhores indicadores de redução da pobreza. Mas a explosão da criminalidade na região mostra que ele não se preparou para enfrentar esse crescimento.
Com reportagem de Júlia de Medeiros
Veja