26 de mar. de 2011

ESTE É O “CABRA” – NOBEL DE LITERATURA- 2011


Por Bira Delgado

ImageEu e minha mania de remar contra a maré. E desta feita, ela chama-se Ariano Suassuna.

Em meados de 2001, fui surpreendido com um telefonema. Do outro lado da linha estava o autor do Auto da Compadecida. E a conversa foi rápida, porém decisiva. A surpresa foi tamanha que até me pareceu um trote do meu amigo Ricardo Anísio.

A conversa transcorreu da seguinte forma: “é Bira é? Eu tô ligando pra meus amigos conterrâneos pra pedir às pessoas que eventualmente ainda pensam em sufragar meu nome na Votação para o Paraibano do Século XX, que se juntem a mim para votarmos em Augusto dos Anjos, a fim de que a Paraíba não deixe de dar ao seu maior poeta este título tão merecido”.

Dias depois, Ariano veio à capital da Paraíba e utilizou a mídia para pedir aos seus conterrâneos que votassem todos em Augusto dos Anjos. Com a ajuda deste cabo eleitoral de peso, dias depois, Augusto dos Anjos liderava com folga a Votação, à frente de personalidades como João Pessoa, Celso Furtado e do próprio Ariano Suassuna.

Esta é mais uma demonstração de grandeza deste homem, capaz de renunciar às próprias conquistas em nome de seus objetivos e ideais. Atitude dessas é para poucos. Recentemente, o teatrólogo e escritor Tarcisio Pereira, divulgou no seu Blog o seguinte texto: “Nobel para Ariano”. Não pretendo, portanto, deixar o nosso Tarcisio Pereira falando sozinho. É meu desejo também ouvir as vozes roucas das ruas.

Disse assim Tarcisio Pereira em seu texto, o qual assino em baixo com muito orgulho e firmeza:

“O Brasil nunca ganhou o Prêmio Nobel de Literatura. Dizem que a vez passou, que agora é necessário esperar décadas, talvez um século, pelo nascimento de um novo mito. Porque o conceito de mito – ou, neste caso, de gênio literário – geralmente se avalia pelos nomes passados. É um equívoco de várias vertentes: em primeiro lugar, não é preciso invocar Machado de Assis para se dizer que já não temos gênios; em segundo lugar, os contemplados com o Prêmio Nobel nem sempre são mitos, em que pesem os interesses políticos e diplomáticos daquela chamada Academia Sueca.

Quando se fala num Prêmio Nobel para o Brasil, são sempre lembrados os três nomes que supostamente concorreram, e esses três já não estão entre nós: Jorge Amado, Guimarães Rosa e João Cabral de Melo Neto.

Há quem diga que, na segunda metade do século, o Brasil perdeu a chance de contemplar um desses três. Vou mais longe, porque podemos enumerar outros nomes com o mesmo perfil, e que sequer foram lembrados: Érico Veríssimo, Graciliano Ramos, José Lins do Rego, Euclides da Cunha, Machado de Assis, Augusto dos Anjos e outros, talvez outros... Dizer quem merece, ou que foi merecedor dessa honraria é muito relativo. Alguém pode achar que Dias Gomes, por exemplo, não preenche os requisitos, mas eu acho que sim – como acrescento Monteiro Lobato, Mário de Andrade, José Américo de Almeida, etc.

Quando, em 27 de novembro de 1895, Alfred Nobel assinou o seu testamento, destacou que todo o resto de sua fortuna fosse destinado, anualmente, a premiar pessoas com serviços prestados à humanidade, especialmente nos campos da Física, da Química, à Fisiologia ou Medicina e à personalidade que mais ou melhor tivesse contribuído para a aproximação dos povos, este que é chamado hoje de Prêmio Nobel da Paz. No testamento, por último, ele acrescentou uma outra categoria, destinada ao autor de obras literárias de inspiração idealista.

Naquele mesmo testamento, Alfred Bernhard Nobel assim declarou, encerrando: “Desejo expressamente que os prêmios sejam conferidos sem qualquer consideração de nacionalidade, de modo a serem atribuídos aos mais dignos, sejam ou não escandinavos”.

É claro que, ao longo de mais de um século, nem todos os países do mundo foram laureados. É no mínimo espantoso, porém, que em mais de 100 anos um país continental como o nosso, berço de tantos autores de “inspiração idealista”, não tenha sido contemplado. Qual a razão? Será o Brasil assim tão pobre, no campo da literatura? Faltam obras meritórias ou até agora não houve articulação, não teve esforço político? Acredito mais na última hipótese.

Países pequenos e vizinhos, dessa grande América do lado de cá, já somam três prêmios: o Chile (para Pablo Neruda), Colômbia (Gabriel Garcia Márquez) e, recentemente, precisamente neste ano de 2010, o Peru (para Mario Vargas Llosa). O Brasil continua a ver navios e, pior que isso, os seus nomes mais lembrados já não estão entre nós.

Hoje, depois daqueles que se foram, é de se perguntar qual o brasileiro vivo possui o perfil, o mérito, a consistência, o requisito da chamada “inspiração idealista”. Eu também diria que existem nomes, mas acredito que Ariano Suassuna foi o que restou de um time formado há mais de meio século. Ariano, justamente o nosso Ariano, em que pese uma obra que sempre deu voz aos oprimidos, que é outra característica dos laureados.

O mito está entre nós, sem desmerecer outros nomes que talvez cheguem antes, e que nem enxergamos com essa perspectiva. Mas agora, considerada a presença, é chegada a hora do empenho político. O presidente Lula, se quiser, pode ser o porta-voz dessa boa demanda para uma certa nação que escreve muito, mas que lê tão pouco.

O mesmo presidente Lula que foi tão hábil, e tão convincente, ao atrair para o nosso país os próximos jogos olímpicos – algo mais disputado do que um prêmio Nobel, algo que exige os investimentos e, acima de tudo, o desafio de sepultar obstáculos como a propaganda negativa do crime, sem falar dos espinhos estruturais.

É possível que Ariano Suassuna, recolhido ao seu sossego na Rua do Chacon, em Recife, jamais tenha tido essa aspiração. Mas Ariano é patrimônio do mundo e hoje representa, creio, a maior lenda viva da palavra escrita em nosso país, faltando-lhe apenas a insígnia que esse Brasil não recebeu até hoje. Arrisco em dizer que, se Lula quiser, Ariano é o nome.”

Um grande abraço do Professor Bira Delgado.
ubireval@terra.com.br